segunda-feira, 5 de setembro de 2016

A princesa e a guerreira

Conto que teve como referência o livro "Reino das Sombras" de Camila Fernandez

Num reino distante havia uma princesa. Cercada de privilégios e riquezas era feliz mas faltava-lhe algo, ou melhor, alguém. Pelo menos era isso que ouvira desde a tenra infância. Um homem, seu salvador. Aquele que a tiraria de sua submissão perante sua família. Mesmo cercada de privilégios e riquezas, mal podia sair do castelo. Claro, todos temiam sua segurança mas era muito diferente do seu irmão que, desde cedo já acompanhava o rei nas caçadas... 

Certo dia, porém, quebrando sua rotina monótona de eterna espera, eis que o rei e a rainha anunciam que ela irá para uma terra longínqua. Não para conhecer um homem, mas para conhecer a língua e os costumes do local. Não ficaria nem muito, nem pouco tempo. Mas ficaria o suficiente para aprender mais, conhecer mais. O rei e a rainha temiam que a filha não conhecesse nada além do seu reino. Mesmo tratando o príncipe de forma diferente, deixando-o livre para ver o mundo, tinham um leve senso de justiça. Não queriam prender a filha para sempre naquele castelo sem deixar que ela visse algo além do que conhecia. Sabiam também que com a chegada de um pretendente, nada mais seria o mesmo... O reino longínquo era de um aliado, que, além de aliado nas guerras, era também aliado econômico. Possuiam mercadorias que nenhum outro reino fornecia. Diziam que as coisas vindas deste lugar tinham algo diferente, traziam sorte...

~ Nas terras longínquoas ~

No reino longínquo também havia uma princesa. Claro que sabia o que representava e não negava isso mas preferia muito mais ser vista como uma guerreira. Desde cedo invadia o treino de espadas dos dois irmãos mas, ao mesmo tempo, também sabia as cortesias de uma princesa. Sabia se portar de modos diferentes, em ambientes diferentes. O rei e a rainha já haviam reprimido muito a princesa por ter o gosto pelas lutas mas, nada podiam fazer. Ela era insistente e o cavaleiro que ensinava os seus irmãos não a tratava com desdém por ser mulher. Ele a via da mesma forma com a qual via seus irmãos. Era muito mais do gosto desta princesa, treinar com espadas com seus irmãos a sorrir falsamente para pessoas que nem conhecia. Na verdade, odiava ser tratada e vista como mercadoria. Como um animal de qualidade que um dia seria vendido a um preço alto para alguém de outro reino... à sua maneira, era muito diferente de uma princesa padrão. Causava admiração. Desejo em alguns e julgamento e condenação em outros.

~ O encontro ~

A princesa chegou ao reino longínquo. Deslocada, com medo e insegura era claro em seus olhos o sentimento de receio quando adentrou um castelo muito diferente do seu com pessoas muito diferentes das quais estava acostumada. Era tudo tão diferente... parecia outro mundo... logo foi encaminhada para seus aposentos e apresentada ao rei e à rainha que a receberam com muita cortesia. Naquele momento, princesa e guerreira foram apresentadas e, mesmo uma não sabendo falar a língua da outra, nasceu uma bela amizade entre as duas porque tinham algo muito importante em comum: um bom coração.

A princesa e guerreira não eram meninas, mas tampouco mulheres. Aprenderam muitas coisas juntas, aprenderam muito uma com a outra porque, por mais que até suas aparências fossem diferentes, elas, acima de tudo, se respeitavam. Passaram não muito, mas nem tão pouco tempo juntas, mas o tempo que passaram, para elas, valeu ouro.

~ O casamento ~

Anos se passaram mas a amizade da princesa e da guerreira continuava firme. Trocavam cartas, iam visitar uma à outra de tempos em tempos. Eis que um dia, chega à guerreira, um convite de casamento. A princesa contraiu núpcias. Feliz por sua amiga, a guerreira imediatamente faz seus preparativos e vai para o reino onde será realizada a celebração.

Chegando no reino da princesa, conhece o futuro marido de sua tão querida amiga. O cumprimenta com educação mas percebe que ele a observa com um olhar de espanto e curiosidade. Já que ela era mulher que ele provavelmente nunca teria visto. Não se incomoda, é normal. Sua aparência é admirada por uns e menosprezada por outros... 

~ Na taverna ~

A guerreira tinha gostos bem peculiares, e um deles, era colecionar venenos... ela justamente andava sempre com duas jóias: um colar e um anel. O anel continha veneno e o pingente do colar, o antídoto. Andava com a toxixidade e a cura para se previnir. Para usar em si mesma em alguma emboscada que sabia qual seria seu destino quando descobrissem que era mulher. Ou... contra algum inimigo mesmo.

No reino da princesa havia uma bruxa conhecida por fazer um veneno específico. A guerreira ouvira falar dela. Ao seu modo, descobriu onde e quando ela poderia estar. Conseguiu negociar um frasco deste veneno. O preço foi alto e só seria entregue em alguns dias em uma taverna. A guerreira concordou com os termos da negociação e, no dia certo, na hora certa, lá estava ela, na taverna, discretamente disfarçada.

A bruxa a encontrou e de forma sutil lhe entregou a mercadoria. Negócio fechado. Quando está quase de saída, eis que ouve a voz do futuro príncipe. Ela não vai cumprimentá-lo pois está com vestes suspeitas para uma princesa ou para uma guerreira mas resolve observar o comportamento do futuro príncipe e de seus soldados. Para ver se ele é digno de sua amiga.

Eis que ouve durante a conversa, o príncipe se referindo a ela, a guerreira, de forma extremamente desrespeitosa. Tem curiosidade sobre seu corpo, se há algo diferente. Pergunta aos seus guerreiros que sons ela emitiria na cama. Todos riem. A humilham. Outro pergunta se suas partes íntimas são menores e, supostamente melhores para a satisfação de um homem. Outro também se refere às suas intimidades, pergunta como seria bom se divertir com aquele corpo "exótico". Todos riem... 

A guerreira, tem vontade de contar a garganta de todos os presentes. Mas controla-se. Sabe que não ganharia contra tantos homens e pior, sabia qual seria seu destino após dominada. Todos se divertiriam com seu corpo por horas, se não por dias e depois a matariam para que ela não contasse nada à princesa. Inventariam uma desculpa qualquer para seu sumisso. Se foram capazes de proferir tais palavras, o que não seriam capazes de fazer? Não... neste caso, ela deveria agir de forma mais fria... e alertar a princesa...

~ Decepção ~

A guerreira imediatamente volta para o palácio e conta o ocorrido para princesa. A guerreira só queria o bem de sua estimada amiga. Não acreditava que seu futuro marido fosse uma pessoa boa... depois de contar, a princesa, após alguns segundos calada, começa a dizer que, se aquilo que foi dito fosse verdade, ela entendia sua raiva mas que a guerreira deveria tolerar e se esquecer tudo o que ouviu. Dizia que homens falam besteiras e são assim mesmo... a princesa não notava, ela mesma podia estar em perigo... por mais que tivesse uma aparência e origem igual ao príncipe, a guerreira suspeitava de sua índole, de seu caráter. Temia muito pela segurança de sua amiga. Mas, quando insistiu, a princesa enfureceu-se: dizia que a guerreira queria destruir seu casamento porque estava com inveja. A guerreira retirou-se, em lágrimas. Nunca havia sido traída desta maneira. A princesa... já estava cega de amor...

~ Vingança ~

A guerreira era mulher fora dos padrões da época, e por isso, era muito julgada e condenada. Por ser guerreira e vestir uma armadura, era satirizada por uns e respeitada por outros. Nos duelos e campos de batalha, era tão habilidosa quanto um homem. Compensava a falta de força física com inteligência e habilidade. Mas, debaixo da armadura feita especialmente para ela, havia um corpo que despertava desejos... e ela sabia disso. Assim como era habilidosa nas batalhas, era também na cama. Sabia que o único poder que as mulheres exercem sobre os homens, é o poder da sedução. E ela, se utilizaria disso para se vingar e proteger a princesa.

Primeiramente, queria aniquilar os dois principais guerreiros do príncipe. Aqueles que também desferiram palavras cruéis a seu respeito. Para deixá-lo receoso. Quem sabe até ia embora, por medo. Era fácil conseguir ter os guerreiros em suas mãos. Para cada um, planejou minuciosamente sua vingança... mas teve ajuda.

As aias do palácio também eram assediadas pelos novos guerreiros. Em diversas ocasiões, a guerreira impediu que as aias tivessem seus corpos violados. Passado certo tempo, até ensinou a elas como podiam se defender. Haviam três que eram de sua confiança. As aias também não gostavam do príncipe. Para elas, ele era dissimulado. Tratava a princesa com cortesia mas olhava para elas despindo-as com os olhos, além de ser rude e arrogante. Concordavam que ele tinha que partir, gostavam da princesa e não queriam seu mal. 

Numa noite planejada, a guerreira foi aos aposentos de um dos guerreiros. Com um vestuário que deixava seu corpo tentador, sabia que aquele ser repugnante não conseguiria resistir... antes de adentrar o quarto, colocou na ponta da sua língua uma gota do veneno que negociou com a bruxa. Foi fácil seduzi-lo. Ela sabia desta fraqueza dos homens, principalmente, homens com valores distorcidos. Beijou-o com vontade. Mas com vontade de tirar sua vida. Era como se ela quisesse ela mesma depositar o veneno no fundo da garganta daquele ser. O guerreiro logo ficou alterado. Não sabia porque aquela sensação era nova. Imaginou que a mulher de outro povo realmente tinha algo de especial, mal sabia ele que sua especialidade era a morte. A guerreira se afastou e logo tomou o antídoto que sempre vinha com o veneno. O ser, morreu em relativa paz. Entorpecido pela excitação que ela causara e confuso com a dor no peito e no estômago que sentia. As três aias e a guerreira sumiram com o corpo. O instinto de auto-proteção falava mais alto... 

Procuraram pelo guerreiro. O mistério ficou no ar... Uns diziam que, de tanto beber, ficou insano, foi à noite para a floresta e depois foi devorado por uma fera. Outros diziam que se afogou bêbado no rio... mas, nenhuma suspeita. Quem poderia suspeitar de mulheres "fracas"... não teriam força para se livrar de um corpo...

O segundo guerreiro teve um fim semelhante. Mas, já que era mais atento e esperto, suspeitava de todos após o sumisso de seu companheiro. No jantar da noite planejada, uma das aias colocou respingos do veneno do anel da guerreira na taça do guerreiro. Não era o suficiente mas era o sufiente para fazê-lo se retirar aos seus aposentos. A guerreira já sabia o que tinha que fazer. Seduziu novamente. Mesmo relutante, o segundo guerreiro não conseguiu resistir. A guerreira amarrou-o na cama, ele, que nunca havia experimentado algo que o dominasse, ficou excitado. Sentia que realmente a mulher estrangeira tinha algo de "diferente", "especial". Mal sabia que sua especialidade iria matá-lo. Depois de dominado e entorpecido, a guerreira depositou o restante do veneno na boca do segundo guerreiro. Foi seu fim. Assim como o primeiro guerreiro, a guerreira e as aias se livraram do corpo com sensação de alívio. Seu sumisso foi um mistério mas já haviam suspeitas de conspiração.

Estes eram os piores guerreiros. Os que apodreciam os outros com ideias grotescas e obcenas. Os outros apenas reproduziam e os temiam. Afinal, eram o braço direito e esquerdo do príncipe.

Finalmente, chegou a vez do príncipe. Era para a guerreira o último gole do doce vinho da vingança... Não tinha mais veneno e pensava que seria mais difícil seduzi-lo então, a solução seria infincar uma adaga em seu coração. Com a ajuda das aias, distraiu os guardas e entrou sorrateira nos aposentos do príncipe, que já dormia com a princesa, mesmo antes de desposá-la. A princesa o amava tanto que saia de seus aposentos escondida para dormir junto ao seu amado. A guerreira ficou surpresa ao ver a cena mas logo se conformou. Via nos olhos da amiga uma menina que nunca teve seu coração partido, por isso, via o príncipe como tudo em sua vida. Via isso em seu olhar quando os observava caminhando pelo jardim ou fazendo refeições. A princesa estava nas mãos do príncipe.

Mas todos aqueles sentimentos de piedade sumiram ao se lembrar como ele se referiu a ela, à guerreira. Queria aniquilá-lo não só por ela, mas pela princesa. Não sabia o quão era dissimulado. Não sabia se a princesa correria perigo no futuro após a morte de seus pais...

Quando foi desferir o golpe, a princesa se mexeu, a guerreira até temeu que ela acordasse mas, se mexeu para se aninhar nos braços do seu amado... ela sabia que, se desferisse o golpe nele, sua amiga nunca a perdoaria. Seria caçada. Talvez isso até desse início a uma guerra. Como o amor cega... 

A guerreira deixou a adaga no criado mudo como símbolo de misericórdia mas, de ódio também. Era inocência da princesa pensar que a guerreira sentia apenas raiva. A guerreira, sentia o mais puro dos ódios e decepção.

Saiu discretamente do aposento. Pegou suas coisas e levou as três aias consigo. Correriam risco se continuassem lá.

A guerreira partiu, para nunca mais ser vista.

Não se sabe o destino da princesa. Se continuou a ser bem tratada pelo príncipe ou este a descartou depois de tomar o poder e esta conceder-lhe filhos.

Elas viveram suas vidas paralelas, sem nunca se encontrarem novamente...

Secretamente, a guerreira queria que a princesa encontrasse um nobre genuíno, bondoso, cortez... mas ela nunca soube se isso aconteceu.

Só pensava que o homem que destrói a amizade de duas mulheres com palavras obcenas, não pode ser um homem bom...

Mas ela partiu para que os dois pudessem ser felizes. Sabia que não suportaria seus instintos e poderia desferir um golpe mortal no príncipe a qualquer momento...
    
Até hoje não se sabe o que houve tanto com a princesa, quanto com a guerreira...

Este conto teve como referência uma degradante experiência pessoal. Em que o namorado de uma das minhas melhores amigas quis saber como eu gemo por ser asiática. Esta mesma pessoa era/é um dos melhores amigos de um rapaz que eu namorei. Outros amigos e parentes do meu ex também disseram coisas obcenas a meu respeito. Por eu ser mulher e por ser asiática. Racismo e misoginia, juntos num coquetel tóxico que desumaniza. Minha ex melhor amiga ainda tentou colocar panos quentes na situação. Eu terminei com ela por causa dele. Maldito é o homem que desfaz a amizade entre duas mulheres. 

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

"Vitimismo"

Ouve-se muito o termo "vitimismo". Eu acho desgradável. Seria, nas entrelinhas "Você está se fazendo de vítima". É invalidar, diminuir a dor do outro. Mas... e se a pessoa realmente for? Dizem muito isso para negros, gays, mulheres, pessoas trans... as minorias. Mas... pensando bem... será mesmo que a vida deles sempre foi um mar de rosas e eles "só reclamam"?

Eu duvido.

E mesmo o que chamamos de "homem branco cis hetero" (ok, eles realmente são o que descrevi, não estou sendo irônica ou sarcástica) sendo as pessoas "no topo da escala", quem disse que não sofreram em algum momento de suas vidas? (ok, eu acho que alguns, não - geralmente os caras do bullying hipermimados pelos pais - Mas outros, sim). Eu nunca diria que a dor de uma pessoa assim é "vitimismo" porque ele "não pode ser vítima". Também é. Tenho amigos que sofreram bullying. Por estarem acima do peso, por serem tímidos, por serem "os nerds"... isso afetou muito a auto-estima deles. Eu percebia... Eu nunca diminuiria a dor de nenhum deles porque estão no "topo da escala". Mas o problema, é quando eles diminuem sua dor, ao invés de empatizar com você... Não sou muito fã do "Pelo menos". Evito usar ao máximo. 

Assim como meu amigo gay ouvia de mães de amiguinhos de infância: "Não quero que meu filho ande com este menino. Ele é estranho." Sofreu bullying no colegial e ainda corre risco de apanhar na rua hoje em dia devido a sua orientação sexual. Como ousaria chamar ele de vitimista? Como?

Eu não tenho nenhum amigo negro mas quando vejo os vídeos de pessoas negras na internet (atletas, por exemplo) chorando depois de ouvirem coisas tão pesadas, insultantes, humilhantes, como não me comover? Por que choram? Porque... não estão sendo vistos nem como seres humanos... não estão sendo respeitados. Sua dignidade e auto-estima estão destruídas... e... porque? Talvez porque foram vistos como "ruins", "inferiores" desde a tenra infância. Sem contar a pressão por serem atletas. E isso vai juntando... de grão em grão... como não se ofender com tantas coisas cruéis proferidas de graça, por "gente" que nem se dá ao trabalho de vê-los e conhecê-los como pessoas, como semelhantes?

Também não conheço nenhuma pessoa trans mas imagino como deve ser nem poder existir para sociedade... são vistos como "aberrações", "coisas"... recebem olhares de nojo... a única experiência que tive com pessoas trans foi quando fui para a Tailândia. Era um show de mulheres trans. Ao final, podíamos tirar foto com elas. O guia nos orientou (pra mim, na verdade, nos educou também): "Por favor... se vocês não quiserem tirar foto com elas tudo bem... mas não as olhem com discriminação e nojo... isso as fere muito. Elas também são pessoas... sabem... elas vivem em péssimas condições de vida. Às vezes, precisam comer apenas miojo porque não tem dinheiro para comprar comida. Então... por favor... respeitem. Elas são pessoas."

Mulheres... ah... tantas histórias, tantos abusos... perto de mim. Parentes, amigas... Abusos físicos, abusos psicológicos... vou até deixar para outro post para relatar algumas histórias... "Vitimistas"...

Eu não sou a favor da pessoa ser dissimulada e usar sua condição para obter vantagens, tirar proveito dos outros ou prejudicá-los. Isso, é ser cuzão/cuzona mesmo, independentemente de quem for. E aí vai da índole, do caráter da pessoa também.

Mas, muitas vezes, achamos "exagero" a reação de uma pessoa em x situação. Para o outro, pode parecer exagero porque ele não está na pele de quem está sofrendo... vai saber o que esta pessoa já passou? O que ela ouviu? Desde quando, por quem? Talvez até pelos seus familiares. Isso tudo... não vem do nada... "Ex nihilo, nihil fit" (Nada vem do nada). Ao invés de chamarmos a pessoa de "vitimista" por que não tentar entendê-la? Por que não tentar criar um elo, uma conexão para conhecê-la melhor e orientá-la? Talvez ela mesma não perceba que não está sendo empática com os outros, que talvez os outros não tinham intenção de prejudicá-la, que foi um acidente, por exemplo. Pessoas com traumas gerados desde muito tempo tem memória de situações ruins acumuladas. Por isso, precisam ser defensivas para evitar que este sentimento ruim de insegurança e impotência volte. Está tudo muito ligado à auto-estima também que, por causa de pequenos traumas, micro agressões sofridos durante a vida inteira, se tornaram algo muito, muito maior... bom, eu aprendi com meus amigos frases que podem ajudar alguém que está sofrendo:

"Eu sinto muito que você tenha passado por isso."

"Você tem todo meu apoio."

"Eu não sei exatamente como é a dor que você está sentindo mas me coloco no seu lugar e tento imaginar... eu sinto muito que você esteja passando por isso."

Um trauma, uma insegurança enorme gerada depois de uma agressão física ou psicológica não é algo que sara tão rápido. Se agressões físicas demoram para sarar, psicológicas às vezes perduram por anos ou nunca saram. Então... que sejamos "agentes de cura"... por mais que não consigamos "curar" o outro 100%... a intenção já significa muito...



sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

Para os que dizem que uma mulher é "fácil"

Para os que dizem que uma mulher é "fácil", olhem para si mesmos, primeiro.

Eu sempre ouvi "Não seja fácil." Que mulher nunca ouviu? Se houver alguma, é caso raro. É curioso pensar o quão hipócrita isso é. Homens que dizem isso mas em alguma época da vida tiveram "várias namoradas" e/ou foram pra balada ou micareta pegar geral. Ou foram morar em algum país estrangeiro em que, por status cultural, conseguiram ficar com as mulheres locais por causa da sua aparência e, ao invés de agredecerem, sentirem-se sortudos, privilegiados por isso, as chamam de "fáceis". Por que uma mulher não pode fazer o mesmo sem "perder seu valor"? Então é isso? Nosso valor se resume à nossa vida íntima? E nossos valores pessoais, morais? Nossas alegrias, frustações e crises, nossa opinião? Nossa humanidade? Nada valem? São só adereço para o nosso corpo?

"Fácil", "Rodada", "Mulher sem valor", "Nunca ficaria com uma dessas", "Namoradeira". São eufemismos para o que todos nós já sabemos. Curioso pensar que se um homem faz o mesmo é "garanhão". No máximo "galinha" mas, não vamos negar, uma mulher que fica com vários rapazes é bem mais mal vista do que o contrário. Por que esta diferença?

Homens assim, hipócritas, cospem no prato em que comem e não percebem que fazem o mesmo, mas, já que não serão julgados por isso (na verdade muitas vezes serão até elogiados), se gabam da sua "virilidade" (que eu prefiro chamar de insegurança).

                          
   Não se esqueça, enquanto um dedo aponta para o outro, existem três apontando para a própria pessoa que julga, que condena. Olhe muito bem para si mesmo antes de falar dos outros.

Mulheres que julgam outras com os mesmos termos, só reproduzem o machismo que lhes foi ensinado. Elas sim, "podem dizer algo" porque "são moças de famiília" mas não percebem o quão seu cérebro já foi lavado. A vida íntima de cada uma, é de cada uma. Se elas são mais reservadas, ok, parabéns. Mas por que se acharem melhores que as outras só por isso? E vice-versa!

Quem somos nós para julgar vida alheia? Quem somos nós para condenar alguém sem ao menos se dar ao trabalho de conhecer a pessoa? Ela e suas complexidades? E quem disse que ele ou ela é uma pessoa boa ou ruim por isso? Quem tem um número maior de parceiros (e os respeita) não deveria ser condenado por tentar ser, à sua maneira, feliz. E sério mesmo... e daí? A vida íntima do outro incomoda tanto? Que tal cada um cuidar da sua?

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Ritmo Zero

"A vagina dela é como os olhos dela?", "Ela tem uma vagina de boas-vindas do Oriente?", "Como ela geme?" "Ela é defeituosa" 

São frases cruéis das quais eu nunca vou me esquecer, vinda de "homens" próximos a uma pessoa com a qual me relacionei um dia. Se eu soubesse que ouviria tudo isso, nunca iria querer tê-lo conhecido. Não era pra eu saber nenhuma delas. Mas, por mais que doa muito, que tenha dilascerado a minha alma, ainda bem que eu sei. Agora eu sei o que eu sou e sempre fui para eles (e para muitos outros): nada. Ou, no máximo, uma coisa. Mas vamos por partes:

Quem disse a primeira frase foi o tio do meu ex. O "homem" deve ter mais de 40 anos e, se ainda fala este tipo de coisa, percebe-se o nível moral do indivíduo. Um "homem" de mais de 40 anos se comportando como um adolescente de 14 anos. No caso, meu ex só respondeu "hahaha" por mensagem, como se não soubesse o que mais responder. Parecia confuso, na verdade. Não percebeu que seu tio estava me vendo como uma coisa, um objeto de ridicularização e deboche.

Quem disse a segunda frase foi um "amigo" do meu ex. Se é pra ter amigos assim, pra que inimigos, né? Nesta, ele até ficou bravo. Dava pra ver pelo ser semblante mas, foi omisso também. Bom, foi o jeito dele reagir: fazer nada. Eu já sou um pouco diferente...

Quem disse a terceira frase foi outro amigo do meu ex, que, por sinal, namora minha amiga. Este foi o que mais me feriu. Por que? Ora, porque ele é namorado da minha amiga e amigo do meu companheiro, na época. Não é uma pessoa randômica da internet, aquele tio super zoado ou um amigo randômico. Existe aí uma relação indireta. Mas, foi muita inocência minha esperar coisas como consideração e respeito. Com a frase dita ele não só me desrespeitou como, também, minha amiga e o amigo dele. Fui desrespeitada pelo meu gênero e pela minha etnia, minha origem (mas até então, todos os que disseram tais frases). Se eu fosse ocidental, branca, ele não iria perguntar tal coisa. Afinal, ele "jaá sabe", né? Eu chamo isso de racismo mesmo. Não vamos negar.

No final das contas, eu fiquei muito mal. Muito mal mesmo. Ao sair na rua, fiquei tensa por meses quando via um grupo de homens passando por mim e rindo. Imaginava se eles estavam pensando estas mesmas coisas sobre mim. Isso tudo, pegou na minha auto-estima, na minha dignidade, na minha segurança como indivíduo. Foi assédio moral com um plus de racismo puro. Para eles, muito provavelmente, é "tudo frescura minha" e eu sou uma "exagerada". Aquele gaslight básico. Tão clichê que até cansa. Muito fácil falar isso quando você não é o prejudicado, que passa por este tipo de agressão psicológica. Quando você não é quem ouve "Japinha gostosa te comeria agora" quando passa na rua ou cospem na sua mala porque você é de outra etnia. Fácil falar quando você é o privilegiado em todos os aspectos socias por ser homem e por ser branco, porque a sociedade foi feita para você. Eu nunca passei de um "puppet" para eles. "Não é nada pessoal" ouvi também. "Não é", mas é. Como desrespeitar meu gênero e minha etnia não é pessoal? E não é só por mim, é pelas outras mulheres. Asiáticas, negras, árabes, indígenas... todas, TODAS. Não somos bonecas com um coração sem ritmo para foder, que gemem para satisfezer os homens. Nunca fomos. Somos seres humanos. Pena que muitos não nos enxergam dessa forma... jaá passou da hora de mudar esta merda.

Segue o link de uma obra de Marina Abramovic, artista peformática renomada. Infelizmente não consegui incluir neste post mas vale muito a pena dar uma olhada.

https://vimeo.com/71952791


"Eu comecei a me mexer, comecei a ser eu mesma porque eu era apenas uma boneca para eles e, naquele momento, todos saíram correndo. As pessoas não puderam me confrontar sendo eu, uma pessoa." - Marina Abramovic 


Então, para quem quer saber "se a vagina de uma mulher asiática é como seus olhos", "se a vagina de uma mulher asiática é uma "vagina de boas-vindas do Oriente"" ou "como uma mulher asiática geme", recomendo: conheça uma, conquiste uma. Saiba quem ela é, saiba a história dela, reconheça os sacrifícios que ela fará por você. Valorize-a pelos seus valores pessoais e não a julgue ou condene pela sua vida sexual. Conheça os pais dela (saiba que ela tem pais, tem família, irmãos...). Humanize-a. Aí sim, depois de um tempo juntos, você vai descobrir quem ela é de verdade e, ocasionalmente, tirará todas as suas dúvidas sobre as frases cruéis mensionadas. E, por saber, agora, que ela é uma pessoa, um ser humano, duvido que você queira que seus amigos saibam da vida íntima de vocês, do corpo dela, que não é um objeto. Você finalmente vai descobrir que ela possui um coração, que tem... ritmo.

Creio também no condicionamento ao qual as pessoas são sujeitas. Tenho observado mais as crianças estes tempos, são como esponjas... se estes "homens" disseram tais coisas, não veio do nada. Ex nihilo nihil fit (Nada vem do nada). Eles foram ensinados a pensar assim e não tiveram a mínima capacidade de reflexão, bom senso e respeito para medirem suas palavras. Uma vez, por curiosidade, fui pesquisar a biografia de Hitler. Bom, não foi ele quem inventou o anti-semitismo. Ele aprendeu o anti-semitismo. Com professores, com o ambiente. A misoginia e o racismo não são diferentes. Foram ensinados há milênios atrás. Desconstruir isso não é fácil. Claro que não é. Mas é por isso também que estou aqui, escrevendo. Já passou da hora de sermos respeitadas. Quem sabe, com a internet, a mídia, etc. eles mesmos não se educam um pouquinho? Quem sabe com o feminismo em voga alguma mulher perto deles comece a perceber como ela é vista de forma diferente e tente conscientizá-los também? Quem sabe o tio de 40 anos chegue aos 60 anos pensando diferente? Quem sabe os rapazes de 20 e poucos anos, cheguem aos 40 menos machistas? Quem sabe podem criar seus filhos e filhas de forma igualitária e cooperativa? Quem sabe ensinem-os a respeitarem o sexo oposto e outras etnias que não sejam a sua própria? Quem sabe podem ensiná-los a não discriminarem ninguém seja por qual motivo for? Quem sabe... nesta ou nas próximas vidas.

sábado, 17 de outubro de 2015

Meu lado Harley Quinn

É interessante perceber como personagens mitológicos, de animações, HQs e etc. são um símbolo desde a nossa infância. Nos identificamos, queremos "ser" eles ou até relacionamos e entendemos melhor aspectos nossos, comparando comportamentos com os personagens. Eu acho a Harley Quinn uma personagem interessante mas não sabia exatamente porquê. Talvez, porque parte de mim se identificava com o lado "louco" dela e, descobrindo a história da personagem, acabei descobrindo parte de mim também.

Ela é a psiquiatra responsável por tratar o Coringa mas acaba se envolvendo com ele porque se comove com a história dele (o que o Batman fala que é tudo lorota). Ela tem empatia, compaixão e isso faz ela começar a gostar dele. O problema é que ela começa a entrar num relacionamento extremamente abusivo, uma montanha-russa, um pesadelo emocional. Parece que ele a trata bem quando convém. Depois a trata mal e depois bem de novo (talvez por isso ela fique ainda mais louca).

Até quando a Poison Ivy vai matá-la, Harley está tão chateada (porque se desentendeu com o Coringa) que nem se importa se vai viver ou morrer. Isso intriga Ivy e depois elas se tornam grandes amigas. Depois, Harley volta para o Coringa e novamente recomeça o ciclo de inferno emocional do qual ela não consegue se livrar. Ela sempre perdoa mas ele nunca muda. Até a Ivy fica inconformada como se dissesse: "Que que você tem na cabeça?! Por que sempre volta para ele?!"

Diferentemente da Catwoman e da Poison Ivy, parece que a Harley age de maneira infantil e dependente. Até a voz dela é mais aguda do que ela como a doutora Haleen Frances Quinzel. A Catwoman dá uns pegas no Batman e parece estar muito bem resolvida quanto a isso. Poison Ivy ama as plantas dela e está bem resolvida com isso também.

Mas, voltando à Harley, em outra ocasião (não revelarei detalhes para não dar tanto spoiler), fica com outro cara (me esqueci o nome) que é bem abusivo também. Talvez seja um ciclo vicioso do qual ela não consegue escapar.


Eu já cometi meus erros também. Na época ficava oscilando. Bem e mal, bem e mal, bem e mal... porque a pessoa me tratava bem quando lhe convinha. Até cheguei a nomear "relacionamento complexo de Estocolmo". Também já cheguei a ser subserviente em outra ocasião. Tolerar muitas coisas, muitas falas cruéis vindas de pessoas próximas à quem eu estava junto que eu, hoje em dia, não toleraria. Na época, a pessoa não teve coragem de enfrentar os amigos e não percebeu o quanto uma fala machista e racista pode ferir a alma de outrem para sempre. Empatia zero, como diz uma amiga. Mas é difícil para alguns homens terem este tipo de sensibilidade e respeito afinal, nunca ouviram e nunca ouvirão "Japinha gostosa te comeria agora" somente por estarem andando na rua. Fácil dizer que "Não é nada, você está exagerando." Como disse, empatia zero.

Pessoas abusivas, tanto homens quanto mulheres, companheiros, companheiras, "amigos", "amigas" são lixo nuclear. Um câncer emocional. Se desvincular delas muitas vezes é difícil porque vira, realmente um "relacionamento complexo de Estocolmo". É preciso muita força interna para finalmente dizer "não".

E tudo isso eu "permiti" que acontecesse comigo por causa de um nível extremo de carência... me sentia sozinha em um país estrangeiro. Era raro falar com meus amigos próximos... Estava totalmente cega... tive compaixão, queria ajudar... isso tudo foi um coquetel tóxico.

Dependendo do nível da carência, ela pode ser extremamente tóxica. Te deixa cega e encobre comportamentos abusivos, humilhantes e desrespeitosos dos outros. É como uma anestesia. Você não sente que estão te machucando mas quando o efeito passa... todas as feridas psicológicas vem à tona. O problema é quando este veneno perdura por anos. Felizmente, isso não chegou a acontecer comigo e o que aconteceu, que nunca mais aconteça.

"Um pouco de veneno, de vez em quando, produz sonhos agradáveis. E muito veneno, por fim, para ter uma morte agradável."

Zaratustra


domingo, 13 de setembro de 2015

Like a girl, like a woman, like a human

"Like a girl", "Como uma menina". Termo comum também no Brasil. Há pouco tempo eu não percebia o quanto este termo depreciava o sexo feminino. Há alguns anos atrás eu até usava o termo "nervosa" me referindo mesmo a um homem quando ficava buzinando à toa no trânsito. Hoje em dia eu mando todo mundo que faz isso, homem ou mulher, para o inferno. Não diferencio mais por gênero porque, pensando bem, "nervosa" fica na mesma categoria de "Like a girl". "Nervosa" parece que indireta e inconscientemente expressa que somente as mulheres ficam nervosas, são as "loucas" mas, cá entre nós, quem mais briga e é violento no trânsito? É, não são as mulheres. "Like a girl" tem um tom pejorativo porque é como se chamasse os indivíduos do sexo feminino de frágeis, fracos, incapazes.

Uma vez vi uma propaganda bastante interessante que aborda isso:




No vídeo tem uma parte que me chamou bastante a atenção. A entrevistadora pergunta: 

- Então, você acha que você acaba de insultar sua irmã? 

- Não, quer dizer, sim... insultei meninas, mas não minha irmã.

Não? Sua irmã não é uma garota por acaso? Pobre criança... ainda tem muito a aprender.

Bom, é por isso que eu não falo que "nenhum homem presta" porque é a mesma lógica: "Nenhum homem presta, menos meu pai, meus irmãos e meu namorado ou marido". E eu conheço todos os homens do mundo por acaso? Seria muita hipocrisia minha defender uma coisa a meu favor e prejudicar o outro com o equivalente oposto.

Bom, uma variante do "Like a girl" que eu já ouvi também foi "Don't be a woman" mas, eu percebi que meu colega não falou isso na maldade. Ele falou porque já foi condicionado desde a tenra infância a pensar assim. Como o menino da propaganda. Como maioria dos homens, creio eu.

Era natal do ano passado. Eu ainda estava em Taiwan e fui jantar com uns amigos. Numa hora eu não queria beber mais sakê e, este colega meu me disse: "Ora, não seja mulher..." eu, imediatamente respondi: "Mas eu sou!" Dando de ombros com uma cara meio inconformada como se dizendo: "Mas sério que você não está vendo que eu sou mulher?" Falei novamente com a mesma expressão.

Conversando com um amigo meu, muito querido, ele me disse: 

- Ah... o condicionamento machista é tão enraizado na mente das pessoas que eles (e elas) nem pensam o que estão falando. Mas conseguimos notar quando é puro condicionamento e quando é sarcasmo...

Por isso respondi firmemente e até meio inconformada o que ele me disse. Acho que ele não percebeu. Não foi desta vez. E este homem já tinha sido cortez comigo antes e conversava normalmente comigo mas infelizmente... repetia um padrão já tão condicionado. Mas eu tenho esperança que isso mude aos poucos. A publicidade deste post já é algo bem conscientizador na minha opinião.

Espero que um dia possamos nos tratar simplesmente como humanos... independentemente do gênero, da orientação sexual, da etnia, da idade e da religião (ou não religião).

Claro, isso é utópico e o todos os seres humanos nunca serão 100% benevolentes mas, se cada vez mais pessoas respeitarem umas às outras, o convívio social humano ficaria bem melhor. Evitaria muitas mortes e até guerras...




sábado, 29 de agosto de 2015

Como fazer parte de dois mundos e, ao mesmo tempo de nenhum

Creio que muitos descendentes de asiáticos mundo afora tem esta sensação: fazer mas não fazer parte. Principalmente se cresceram em países ocidentais. Creio que maioria, se não todos, já sofreram algum tipo de preconceito. Deste o primário. Porque somos diferentes e claro, educação moral não é o forte de muuuiiitos pais. Até na rua, na praia, no cinema, no supermercado, no zoológico, no parque... há hostilidade. Como não se sentir incomodado? Quem gosta de ser incomodado por simplesmente ser o que é?

Mas, ao mesmo tempo, quando "voltamos" para a terra natal dos nossos ancestrais (o que recomendo a todas as pessoas), não somos de lá também. A língua, o alimento, as pessoas... por mais que ninguém nos enxergue como estrangeiros, na verdade, nós somos. 

Em Taiwan (sim, sou descendente direta de taiwaneses) não sofri muita hostilidade. Era mais ignorância, burrice e babaquice alheia mas nada no estilo: "Volte de onde você veio. Você não ê bem-vinda aqui". Mas, conversando com alguns descendentes de japoneses... parece que lá é neste estilo, infelizmente (se a pessoa quiser ser residente).

É a sensação de não pertencimento. É não ser reconhecido e aceito nem em um lugar, nem noutro...

Mas, ao mesmo tempo, por mais que eu seja "metade de um e metade de outro" (agora falando mais de mim mesmo), não vou negar que posso transitar pelos dois mundos com problemas mínimos. 

Sempre pensei nisso: atendo por dois nomes, tenho identidade de dois países, falo a língua dos dois... ora, são poucos assim. 

É muito curioso também ver as diferenças culturais. Os dois lados tem coisas boas e ruins. Tanto os próprios países quanto as pessoas que vivem neles.

Às vezes fico me imaginando como eu seria se tivesse crescido lá. Como eu pensaria? Será que seria muito diferente?

Mas, por ter nascido no Brasil, será que não tenho uma visão diferente das coisas também? Como racismo, por exemplo? Será que eu saberia tão claramente o que é se eu tivesse nascido e crescido lá? Será que me revoltaria tanto quanto me revolto agora?

Claro que eu seria diferente... o ambiente onde uma pessoa cresce faz toda a diferença. 

Fico curiosa para saber como eu seria mas, ao mesmo tempo, me orgulho de ser quem eu sou agora. Quem sabe na próxima vida... Quem será que serei?

Uma pessoa que admiro muito me disse certa vez: "Não se preocupe, aos poucos a miscigenação cultural vai acontecendo. Vocês são recentes mas a cada geração que se passa mais existe esta fusão e aceitação porque vocês também fazem parte daqui. Isso leva gerações... mas está acontecendo."

Claro que sempre existirão os preconceituosos e xenofóbicos (contra todas as etnias senão a deles mesmos)... mas espero que o número destas pessoas diminua drasticamente algum dia. Seja por uma auto-educação (melhor) ou por medo de represálias mesmo.

Bom, recomendo um filme muito bom que fala justamente desta crise de identidade que muitos asiáticos (creio eu) tem em países ocidentais. 


           "Sou daqui e de outro lugar. Não sou branco, nem negro. A cor da minha pele é mel..."